Cristiéle Borgonovo
Enadir May, conhecido carinhosamente como Nico, tem 62 anos e uma trajetória marcada por amor e dedicação à profissão de sapateiro. Natural de São Miguel do Oeste, no Extremo-Oeste de Santa Catarina, ele deixou a terra natal ainda jovem e mudou-se para Três Coroas, no Vale do Paranhana, no Rio Grande do Sul. Foi lá que teve o primeiro contato com o universo calçadista, onde descobriria a vocação que o acompanharia por toda a vida.
No Rio Grande do Sul, permaneceu por 25 anos, sempre ligado à indústria de calçados. O primeiro emprego foi na Calçados Subli, onde iniciou no setor de corte. “Lá comecei no corte, na época em que tudo era feito com a faquinha. Cada peça era talhada manualmente, exigindo precisão, paciência e força nos braços. No fim do dia, o cansaço era grande, mas o orgulho do resultado compensava”, relembra com um sorriso.
Depois dessa experiência, trabalhou por três anos em uma empresa de calçados injetados. Apesar da estabilidade, não se identificou com o processo mais mecanizado e decidiu retornar ao corte. “O corte é o início de tudo. É ali que nasce o formato do calçado. Sempre gostei de ver o couro e sintético ganhando vida”, explica.
Há 21 anos, Nico mudou o rumo da própria história ao se mudar para São João Batista, a Capital Catarinense do Calçado. A mudança ocorreu após o incentivo de amigos que já trabalhavam na cidade. “Eles me diziam: ‘Vem pra cá, o setor calçadista está crescendo e há oportunidades para quem quer trabalhar’. Decidi apostar. Foi a melhor escolha que fiz”, afirma.
Ao lado da esposa e dos dois filhos, fixou raízes em solo batistense. O primeiro emprego na nova cidade foi na Contramão Calçados, onde permaneceu por oito anos. Em seguida, passou pela Leidi Lu, onde atuou por dois anos, e há cinco está no Calçados Ala, empresa onde consolidou a experiência adquirida em mais de três décadas de profissão. “Tentei mudar de área por um tempo, mas percebi que o calçado faz parte da minha vida. É algo que aprendi a amar”, declara.
A trajetória de Nico reflete também a evolução do setor calçadista nas últimas décadas. Ele acompanhou de perto a transição do trabalho artesanal para o uso de tecnologias. “Antigamente, tudo era feito à mão, em pequenas quantidades. Hoje há máquinas que cortam couro com precisão milimétrica, como o balancim e o corte a laser. O sistema CAD digital mudou completamente o processo. Mas, mesmo com tanta tecnologia, o toque humano continua essencial”, observa.
Para ele, a profissão de sapateiro é uma arte que exige paciência, atenção e, acima de tudo, amor pelo que se faz. “O corte é a minha paixão. Cada material tem um comportamento diferente, e é preciso conhecer o sintético, respeitar o tempo e entender o processo. Trabalhar com calçado é ver a transformação acontecer diante dos olhos”, relata.
A esposa, também sapateira, contribuiu por muitos anos com o desenvolvimento do setor e se aposentou atuando na área. Hoje, Nico se orgulha de ter construído a vida com base no trabalho honesto e na dedicação ao ofício. “Foi o calçado que me deu tudo o que conquistei. Graças a essa profissão criei meus filhos, construí minha casa e vivi momentos de muita alegria. O sapateiro é parte da história de São João Batista e do crescimento dessa cidade”, afirma com emoção.
Com cerca de quatro décadas de experiência, ele segue com o mesmo entusiasmo do início da carreira. “Tenho muito orgulho de fazer parte dessa história. Enquanto puder, quero continuar ajudando a transformar o material do trabalho das mãos em calçados que caminham pelo Brasil afora”, conclui.



