Cristiéle Borgonovo
Vera Lúcia Sagaz, 63 anos, é natural de São João Batista e desde os 13 trabalha como sapateira. Mesmo aposentada desde o ano passado, continua em atividade. Há meio século, atua no setor calçadista. Já foi colaboradora, manteve ateliê em casa e também empreendeu ao lado do marido.
Aos 13 anos, iniciou o primeiro emprego na extinta Calçados Josirene, no setor de acabamento, onde realizava a limpeza dos pares de calçados. Certa vez, o costureiro faltou e, ao perceber o empenho da jovem, o patrão a convidou para costurar. “Deram-me alguns pedaços de material, eu costurei, depois passei a fazer os cabedais e nunca mais deixei a costura”, recorda. Trabalhou ali por cinco anos, até completar 18.
Em seguida, casou-se e, junto do marido, montou uma pequena fábrica de calçados, que funcionou por cerca de dez anos. Com o agravamento de problemas renais do companheiro, que precisou de hemodiálise e posterior transplante, ela decidiu encerrar a fábrica e iniciar uma nova etapa.
Com os filhos ainda pequenos e o marido em tratamento, passou a costurar em casa para outras empresas, montando um ateliê de costura. “Foram 12 anos trabalhando em casa, até engravidar do caçula. Temos três filhos, duas mulheres e um menino. Depois que ele nasceu, resolvi voltar a atuar fora, nas fábricas”, relata.
Em 2005, ingressou na Século XXX. Depois, passou pela Calçados Raphaella Booz. Entre 2013 e 2017, trabalhou na Vionê Calçados, especializada em produtos de couro.
Em 2017, começou na Suzana Santos Calçados, empresa em que permanece até hoje e onde se aposentou no ano passado. Lá, atua como costureira de modelagem criativa. É responsável pela confecção dos protótipos em desenvolvimento, unindo as peças, avaliando o calce e verificando se o modelo apresenta boa sequência para a produção.
“Quando me aposentei, pensei: não vou conseguir ficar em casa sem trabalhar. Essa rotina ainda faz parte da minha vida. Os filhos estão criados, o marido, há 30 anos transplantado, está bem. Vou continuar até sentir que é hora de descansar”, comenta.
Vera Lúcia carrega na trajetória a essência de uma geração que ajudou a consolidar São João Batista como um dos polos calçadistas mais importantes do país. Representa milhares de profissionais que, com habilidade manual e olhar atento aos detalhes, transformam materiais brutos em peças que calçam histórias. “Cada par de sapatos leva um pouco de quem o produz. É um trabalho que exige paciência, cuidado e amor. Gosto de imaginar as pessoas usando o que costurei”, afirma, com um sorriso.
Com meio século de dedicação, ela também se tornou apoio entre os colegas. Muitos recorrem à experiência de Vera quando há dúvidas na modelagem ou na montagem dos protótipos. “Procuro ajudar sempre. A gente aprende muito com o tempo, e dividir esse aprendizado é uma forma de retribuir tudo que a vida me deu através do trabalho”, destaca.
Sobre a profissão de sapateira, expressa profunda gratidão por todas as conquistas. O trabalho árduo, aliado à dedicação e ao carinho, permitiu construir uma vida digna, manter a casa e ver os três filhos formados.
“Eu amo o que faço. Gosto de acompanhar todo o processo: pegar cada peça, preparar, costurar, montar e ver o resultado final”, conclui.



