Cristiéle Borgonovo
Sentados na varanda de casa, sentindo o ar fresco bater no rosto e ouvindo o cantar dos pássaros, o casal Maria Crispim Martins, de 73 anos, e Quiliano Martins, de 84, aproveita os dias lado a lado, cercados por uma natureza exuberante. Em Colônia Nova Itália, na parte conhecida como ‘de dentro’, vivem com serenidade, observando de perto o passar do tempo e as transformações da cidade que os acolheu ainda na infância. São João Batista celebra, neste sábado, 19, 67 anos de emancipação político-administrativa. Para eles, cada ano comemorado é também um capítulo de suas próprias histórias.
Dona Lica, como é carinhosamente conhecida, conta que chegou a São João Batista com apenas seis anos de idade, vinda de Antônio Carlos, na Grande Florianópolis. Veio com os pais e os irmãos, fixando morada no bairro de Arataca, também na zona rural. “Quando a gente era criança, não tinha muitos recursos para sair e passear. Mas lembro bem de uma vez que marcamos uma visita à Usati – Usina de Açúcar Tijucas – no centro da cidade. Fomos de carona, na carroceria de um caminhão. Eu tinha sete anos. Aquilo ficou gravado em mim: ver os maquinários, o cheiro doce no ar e as sacas de açúcar sendo embaladas. Foi mágico”, relembra, com os olhos brilhando.
Ainda jovem, Lica se apaixonou por Quiliano, um pedreiro contratado por seu pai para trabalhar em casa. A troca de olhares virou namoro, e o namoro, casamento. “No fim da obra, ele disse: o serviço aqui acabou, mas podemos ir embora juntos de bicicleta e começar uma vida. E assim a gente fugiu, como se dizia na época”, conta, rindo. Casaram logo depois, e a pedido do pai de Lica, se instalaram perto da família, novamente na Arataca. De lá para cá, já são 57 anos de união, celebrando as bodas de lápis-lazúli. Tiveram oito filhos: sete homens e, por fim, uma filha.
Há 48 anos, compraram terras em Colônia Nova Itália, onde vivem até hoje. Quiliano lembra bem das dificuldades enfrentadas e da garra para superar os desafios. “Quando viemos para cá, não tinha energia elétrica. Tivemos que vender uma vaca leiteira para comprar os equipamentos e pagar a companhia de luz”, conta ele. O acesso era precário, com estrada de chão batido, buracos e muita lama nos dias de chuva. “Hoje é outra realidade. A pavimentação da SC-408 e da estrada geral melhorou tudo, facilitando as idas ao centro e o escoamento da produção rural”, completa.
São João uma cidade em evolução
As mudanças também chegaram no campo. “Sessenta anos atrás era tudo feito com a enxada. Hoje a gente tem trator, implementos, tudo para facilitar o plantio e a colheita”, relata Lica. Ela se orgulha de ter criado os filhos com o suor do trabalho e de ter contribuído com o desenvolvimento da cidade. “Fomos vencendo com esforço e fé.”
Mesmo com tantas transformações, alguns valores permanecem intocados: a fé, o amor e a simplicidade. No quintal, entre árvores frutíferas e remanescentes da mata atlântica e o cheiro de café recém-passado, o casal vive em harmonia com a terra que os acolheu. Cada amanhecer é celebrado como um presente, e cada canto de pássaro parece agradecer por essa vida que segue em paz.
Sentados na varanda, entre uma conversa e outra, relembram as festas da igreja, as procissões pelas estradas de chão, as festividades do Dia do Colono e os tempos em que a cidade era pequena, mas já carregava a força de um povo trabalhador. “São João Batista cresceu muito, mas ainda tem alma de interior. E isso é o mais bonito”, destaca Lica
No cantinho especial que construíram, Dona Lica e Quiliano vivem com gratidão. Ali, entre o verde dos morros e a luz do entardecer que pinta o céu de laranja, celebram a vida, a família e os 67 anos da cidade que escolheram amar.
“São João Batista cresceu muito, mas ainda tem alma de interior. E isso é o mais bonito”